sexta-feira, 26 de outubro de 2012

FATOS ETERNOS - POPULISMO (PARTE II)

“Façamos a Revolução antes que o povo a faça.”



O título deste artigo é a consistência de todo o período populista, o qual terá seu fim com o golpe de Estado de 1964. Para iniciar a discussão é preciso primeiro indagar o que é o populismo. Para isso, é preciso retomar o titulo deste artigo, o qual resume claramente o que aconteceu em 1963, quando o governo debatia muito sobre algumas reformas, na verdade o que estavam tentando era encontrar alguma forma de tornar desnecessária a participação popular das decisões políticas. Assim, o golpe de 1964 envolve muito mais do que a queda do governo de João Goulart, ou seja, é a aniquilação do regime anterior, acabando com toda a elite política, assim como a exclusão política das massas, acaba com a participação política de quase toda sociedade civil.

Para não cair em uma análise autoritarista, antidemocrata é preciso, ao invés de julgar e discriminar o populismo, fazer uma análise destacando os pontos positivos e negativos, entendendo que o populismo, é uma forma política, baseada em uma visão hegemônica da sociedade. Pois, como lembra Ângela de Castro Gomes (2001.), muitos autoritaristas e antidemocratas utilizam de afirmações genéricas de senso comum para justificar o motivo de serem contrários a participação política. Assim, explicam seu ponto de vista com afirmações do tipo: os políticos populistas são aqueles que enganam o povo, que prometem e não cumprem, usam de um discurso para o povo, enquanto agem de acordo com seus interesses pessoais.

Esta explicação é apoiada em afirmações realizadas pelos políticos da UDN (União Democrática nacional), os quais desde 1945 até 1964 perderam três eleições presidenciais consecutivas (1945, 1950 e 1955) e apoiou a candidatura vitoriosa de Jânio Quadros em 1960, por defenderem um liberalismo, que não se justificava nem se sustentava mais. Também, foram os políticos, que com a ilusão da vitória política apoiaram o golpe militar de 1964. Desta forma, sempre desprezam a massa e a política populista, aconselhando os demais políticos para não tentarem fazer o povo refletir, para prometerem tudo que o povo pede e sempre quando puderem abrace o povo.

È necessário lembrar que as tensões e os debates sobre populismo gerou tensões e gera, percorrendo décadas e décadas, até hoje não havendo um consenso de quando, como iniciou o populismo, nem seu significado, tampouco se ele acabou com o golpe militar em 1964 no Brasil. Para defini-lo buscou a definição mais ampla e consistente, que fosse além do senso comum. Partindo de Gomes, o populismo não é massificação da população, mas uma aliança entre Estado e população. Chegou se ao ponto de vista de Francisco Weffort, que afirma que o populismo é a massificação da população é negar a participação do povo nas conquistas nas décadas de 1930 a 1964.

Weffort é o cientista político brasileiro que melhor trabalhou e definiu o populismo. Ele acredita que o populismo deve ser visto como uma democracia em partes, uma democracia regulada. Porém, afirma que as políticas populistas desestruturaram o movimento operário, não só da Era Vargas (1937-1945), mas de todo o período. Portanto, o político populista defendia uma ideologia, tinha um motivo de tomar suas decisões. Pois, como nota Gomes, o populismo não nasceu do dia da noite, ou seja, ocorreram alguns fatores históricos sociais, que permitissem sua ocorrência, ela destaca alguns: um proletariado, sem consciência de classe, uma classe dirigente, em crise de hegemonia; um líder carismático, que regula a relação proletariado Estado, subordinando as instituições e rompendo com as fronteiras sociais.

Baseado em Weffort, as condições gerais do populismo seriam: 1. Massificação, retira a individualidade das pessoas sem uma conscientização os conglomeram, gerando uma sociabilidade periférica e mecânica, sem consciência de classe; 2. Perda da “representatividade” da “classe dirigente”, a qual se transforma em parasitária e dominante; 3. Presença de um líder carismático. Contudo, é dentro desse contexto político que surgem as classes populares, o que está diretamente relacionado com o processo de desenvolvimento da democracia.

Não pode ser esquecido, como lembra Weffort, são as particularidades da América Latina, ou seja, pode-se utilizar de elementos e teorias que explicam o mecanismo Europeu e dos demais países, porém, não pode abandonar as particularidades locais. Na América Latina, houveram algumas: como a falta de experiência política, tal como a falta de experiência de classes. Com isso, observa-se que nos países latino-americano o desenvolvimento político se deu em diferentes níveis de participação, sendo definido com uma "democracia representativa", por início era uma participação ampliada, até alcançar a participação total. Todavia, é importante destacar que participação é diferente de mobilização política.

Ao estudar os casos dos países latino-americanos, com base ainda Weffor, deve se ressaltar que o contexto destes, que seria o influxo da formação e consolidação do capitalismo. Primeiro, colônias de Portugal ou Espanha, assim como se segue passam ao domínio imperialista inglês, depois dos Estados Unidos, de forma que sempre estiveram sobre uma relação de subordinação exigida pela expansão do capitalismo mundial. O capitalismo na América Latina só se consolidou com a Independência dos países, com o desenvolvimento de uma burguesia agrária ou comercial, na metade do século XIX.

Portanto, a modernização política nestes países foi conseqüência de um processo de perda de hegemonia das classes agrárias. Com isso, na história da América Latina, não é o setor clássico da sociedade burguesa que moderniza o Estado, mas um setor empresarial, isso indica que o desenvolvimento do capitalismo latino-americano esteja no mesmo estágio do europeu. Com isso, algumas teorias nos levam a refletir sobre dois problemas da América Latina, as estruturas reais do processo de acumulação do capitalismo nela, e o outro seria uma indagação sobre o problema nacional das relações políticas e ideológicas entre as classes sociais, os valores nacionais e a “cultura nacional” para as diferentes classes que se confrontam nela. Também, observa-se uma emergência política das classes populares na América Latina, o que significou, por um lado, a pressão popular sobre as estruturas do Estado e do mercado, por outro lado a pressão popular no interior do regime político.

Alguns componentes fundamentais para o populismo, segundo Weffort: a personalização do poder, a imagem da soberania do Estado sobre o conjunto da sociedade e a necessidade da participação das massas populares urbanas. Nesta nova estrutura, o Estado tende a se confundir com a pessoa, a qual assume a posição de árbitro. Contudo, esta posição que o governante assume não poderia ser durável, de forma que nos primeiros anos, a solução encontrada por Vargas foi à implantação de uma ditadura. Com a crise interna das classes dominantes brasileiras, o Estado deve penetrar nas massas populares urbanas, de forma que o chefe de Estado estará representando as massas. Devido à dificuldade da classe dominante, de se assumir como classe, sendo uma das características que levam a mesma a manipular a massa, surge intermediários para assumirem o governo, estabelecendo alianças com as massas populares. As limitações das funções do governo populista estão em duas premissas: Na relação entre a classe dominante e o chefe de Estado; e na relação das classes populares, que limitaram seu poder através das reivindicações.

Seria ingênuo imaginar que o Estado teria inventado uma nova força social, a fim de atender seus interesses no jogo político, apesar de uma análise como esta aparecer real, não tem apoio histórico, algum. Entender a passividade das classes operárias nos decênios posteriores a Revolução de 1930, é entender que a participação política de classe esta de acordo com um auto-reconhecimento, uma consciência de classe, de forma que nenhuma classe no contexto histórico brasileiro possuía, assim, todas foram pacíficas nas décadas que decorreram a Revolução de 1930. Contudo, a noção de manipulação e passividade das classes deve ser relativizada, para conseguir entender-se o real significado do populismo, assim o autor propõe para melhor entender este contexto histórico, que veja-se o populismo como uma aliança entre diferentes setores e diferentes classes sociais, onde a hegemonia encontra-se sempre vinculado as classes dominantes.

De forma, que para entender melhor a influência da pressão popular sobre o desenvolvimento econômico e o complexo quadro político, que inicia com a crise das oligarquias, é necessário realizar uma análise mais a fundo e detalhada dos acontecimentos em cada país, com suas particularidades. Assim, é preciso sair desta análise mais ampla do populismo americano latino e se especificar mais no brasileiro, que é o objetivo do texto, contudo o populismo melhor estudado foi o argentino e muitos dos autores brasileiros se baseiam nos estudos argentinos, assim, este texto acaba por se apoiar também nos estudos argentinos.

Para isso, a partir de algumas particularidades brasileiras será definido populismo. Primeiro, diferenciando o conceito de populismo de “coronelismo”, lembrando que no Brasil sempre houveram muitos Coronéis e sempre se escuta essa denominação, mas o que é realmente o coronel, tem alguma ligação com o político populista. Definir precisamente qualquer conceito utilizado nas ciências humanas em geral, é preciso entender que eles possuí um contexto histórico e diferentes interpretações. Então, para falar desses temas a base ainda será em Weffort, pois no Brasil é uma referência nesse tema.

Tanto populismo como “coronelismo” há uma identificação entre a base e o chefe. Contudo, o “coronelismo” é uma forma de poder local, reduzido ao seu habitat, local no interior de um município, que se caracteriza pela incursão do poder privado no domínio político. Enquanto, o populismo tem suas raízes mais fortes nas localidades onde ocorre a intensificação de urbanização, tendo em São Paulo, como expoente destes dois fenômenos. Assim, é uma relação entre líder e massa que se assemelha a relação tradicional da velha sociedade agrária brasileira. Portanto, as diferenças são inúmeras, em suma, o “coronelismo” é um compromisso entre poder publico e privado, expressada pelo grande proprietário de terras; em contra partida, o populismo é a exaltação do poder público, o próprio Estado estaria em contato com as massas.

Depois dessa análise é preciso interpretar a “massificação” populista, com base em Weffort: 1. A pressão popular sobre o Estado é marcada pela insatisfação, mesmo dos setores integrados ao desenvolvimento econômico; 2. Esta insatisfação é manipulada pelos lideres populistas; 3. A “situação de massas” dissolve os vínculos com os padrões tradicionais e obscurecem a consciência de classe, não são independentes da posição de determinadas classes, apesar das massas negarem esta influência; 4. Deste modo, a manipulação da massa pelos lideres populistas limita-se nestas posições de classes, de forma que se o líder de Estado encontra-se impossibilitado de oferecer algum grau de satisfação popular concreta, sua imagem começa por diluir-se perante as massas.

Desta forma, é possível notar que no Brasil houve diferentes formas de populismo desde seu inicio em 1930 até seu colapso em 1964, as quais além de se diferenciar por ideologias, por região também se diferenciaram por momento histórico. Entre elas, 1930-1937, depois a da ditadura Vargas, depois 1945 a 1954, com o suicídio de Vargas, depois de 1954-1964, com diferentes presidentes, encerrando-se em 1964, com João Goulart. Por ideologias, observam-se duas essencialmente paulistas, exemplificadas por Jânio Quadros, o qual é famoso pelas suas frases: Bebo porque é liquido, se fosse sólido comê-lo-ia e...; e Ademar de Barros. Porém, definir o janismo e o ademarismo, primeiro é preciso ter em mente o que foi e representou o movimento populista na política brasileira. Ou seja, que o populismo, é uma forma popular de consagração de uma pessoa que aparece como a imagem desejada para liderança. De forma, que a massa se integra de mãos atadas aos interesses dos dominantes, por espera que esse faça tudo.

Com isso, é possível analisar a fundação do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), em 1945, um partido ideologicamente populista. Como desta Lucila Almeida Neves (2001), Getúlio Vargas era antipartidário, pois acreditava que assim colocava a política dentro da lógica de mercado do liberalismo. Contudo, devido à conjectura do período, fim da Segunda Guerra Mundial, vitória do liberalismo, fim da Ditadura de Vargas (Estado Novo), Vargas, para continuar no meio político, não teve escolha e acabou tendo que se filiar a um partido, no caso escolheu o PTB.

A proposta do PTB era visando os trabalhadores, sempre pensando no salário na previdência social. Isso muito porque a maioria dos integrantes era sindicalista ou advogado sindicais. Todavia, dentro do partido havia três vertentes trabalhistas:

A getulista pragmática, que foi hegemônica nos primeiros anos pós-1945, os burocratas, tinham como objetivo, preservar o carisma político de Getulio Vargas, montar um partido para os trabalhadores e não dos trabalhadores. Para isso, possuí dois suportes: um de natureza ideológica, que se mostrava um partido de eficácia social e neutro; e outro de natureza organizativa, que buscou base em instituições públicas. Devido ao processo histórico o pragmatismo getulista, foi sendo rompido, enquanto as concepções nacionalistas e desenvolvimentistas foram mudando. De forma a se consolidar uma nova conjuntura social.

Outra vertente era as dos doutrinários trabalhistas, em sua maioria era composta pelos intelectuais orgânicos do partido, visavam o trabalhismo social. Sua base era nas tendências doutrinárias, tendo como figura representativa Alberto Pasqualini. Seus fundamentos básicos eram de forma geral: trabalhismo como etapa para o reformismo social; conservação do capitalismo e da propriedade privada, buscando significados sociais neles; organização autônoma dos trabalhadores em função de uma ampla reforma social; difusão dos princípios trabalhistas na sociedade brasileira; políticas nacionalistas independentes com posições conjunturais e com diferentes subjetividades. Não queriam o fim do capitalismo, temiam o socialismo, de forma, que uma reformulação capitalista, a qual fizesse com que esse fosse menos privatista e mais social, evitaria o socialismo. Em suma, suas reivindicações eram: distribuição da riqueza; realização de reforma agrária com objetivo de uma maior estabilidade social; salários justos; elaboração de um programa de previdência social justo e eficaz; estabelecimento de um sistema de crédito popular administrado pelo Estado; educação político do povo e da juventude; combate ao capital estrangeiro com efeitos maléficos a sociedade; implantação de um regime político que interviesse na economia, de forma que houvesse a maior liberdade política e melhor distribuição de riquezas; manutenção das empresas estatais, abrindo apenas alguns setores para o capital privado; constituição de um fundo monetário ou um poder aquisitivo cooperativo visando os direitos humanos básicos; manutenção das leis trabalhistas; incentivo ao cooperativismo; e investimento na educação.

A última vertente eram os pragmáticos reformistas, atuaram principalmente na segunda metade da década de 1950, seu principal expoente foi João Goulart, tinham tendências getulistas e doutrinárias, era o meio termo. João Goulart, um conterrâneo de Getulio Vargas, Rio Grande do Sul. Teve inúmeros cargos administrativos governamentais, até a presidência da república de 1961-1964, quando foi deposto, pela ditadura militar. Goulart, quando assume o Ministério do Trabalho coloca em projeto muitas das concepções desta frente trabalhista, entre elas: crítica ao capitalismo pelos seus aspectos desumanos e sem pátria; preocupação com o bem-estar da população e com a defesa dos direitos dos trabalhadores; preocupação com a distribuição de renda; pretensão de uma ordem política democrática visando uma justiça social; harmonização entre um “capitalismo sadio” e o bem estar dos trabalhadores; atuação, intervenção do Estado dos conflitos sociais, agindo também como mediador dos mesmos; paz social através de um desenvolvimento mais humano; implementação de bancos estatais que investissem e financiassem os trabalhadores; defesa da realização de uma reforma agrária.

Independente dos Paradoxos e das contradições do PTB e do trabalhismo em si, percebe-se neste movimento, uma solidariedade e uma luta por reformas contra o subdesenvolvimento, mesmo que as propostas e ações sejam contraditórias, ou utópicas, se diferenciando do individualismo compulsivo da atualidade. Portanto, o que foi ideal e base de um tempo, hoje é apresentado como irreal, utópico e ultrapassado, ficando escondido pelas brumas da História, toda uma série de conquistas e lutas de várias gerações.

Com essa análise mais detalhada que Neves fez do PTB, é possível perceber que o populismo não visava só à massificação da população. Embora, seus diversos aspectos negativos, também tiveram inúmeros positivos. Assim, ao invés de ver o populismo como certo ou errado, é importante vê-lo como um estilo de governo, sensível as pressões populares. Sendo possível entendê-lo, somente no contexto de crise política e de desenvolvimento econômico, que se abre com a Revolução de 1930. Manifesta-se no processo de democratização do Estado, apoiado no autoritarismo institucional da ditadura Vargas (1937-45) ou no autoritarismo paternalista ou carismático dos lideres de massas da democracia do pós-guerra (1945-64). Assim, o populismo é um estilo político que em seus diferentes períodos expressam em essencial a crise das oligarquias e do liberalismo. Desta forma, para entender o populismo brasileiro é preciso retomar os acontecimentos entre os anos de 1929 e 1930. Primeiramente, é preciso caracterizar o tipo de sociedade brasileira neste período, uma sociedade agrário-exportadora, com poder local forte. Com essas características, consegue mostrar como se deu a crise da hegemonia oligárquica, com o desenvolvimento do capitalismo mundial, as idéias liberais se difundem pelas Américas, atingindo a América Latina. Assim, esta nova ideologia entra em choque com a antiga ideologia, que sustentava a hegemonia oligárquica.

Portanto, é importante ressaltar e notar que falar de política no capitalismo envolve pensar em economia, assim, é importante entender que o surgimento do populismo no Brasil, se deu devido às mudanças econômicas, também, dos anos de 1930. Assim, é preciso retomar o abalo sofrido pela economia com a crise de 1929, junto com a depressão de 1930, que abre, no Brasil, condições sociopolíticas iniciais para o processo de democratização do Estado. Deste modo, a Revolução de 1930 é o ponto de partida de uma nova fase da história política brasileira, a qual rompe com um Estado oligárquico, ligados às grandes propriedades agrárias, voltadas ao mercado externo, e inicia a formação de um Estado democrático, apoiado nas massas populares urbanas e nos setores industriais. Começa assim, nessa época, a transição de uma, nos termos de Germani, “democracia com participação limitada” para uma “democracia com participação ampliada”. Portanto, devido à permanência dos aspectos básicos das condições estruturais que passam a se configurar, a partir de 1930, por isso da continuidade dessa mesma democracia de 1945 até a queda de João Goulart.

Lembrando, como Weffort ressaltou que a decadência da economia de exportação é reflexo da decadência dos impulsos externos e não um conflito entre os setores urbanos industriais e os setores tradicionais agrários. Em 1930, começa uma política, que possibilita a instalação do capitalismo industrial, criando condições favoráveis para o investimento ligado ao mercado interno e a economia brasileira, que não depende mais exclusivamente estímulos externos. Surgindo uma nova personagem na história brasileira: as massas populares urbanas; a fonte de legitimidade do Estado brasileiro. Assim, aparece o “fantasma do povo”, manipulado por 15 anos por Getulio Vargas, onde o Estado sobre uma estrutura sindical controlava o povo, criando a ideologia do “pai dos pobres”, por legalizar a “questão social”, reconhecendo as massas o direito de reivindicarem por seus direitos.

Retomando a idéia de a mudança de Estado nos países latino-americanos, não ter sido apoiada pela as classes sociais clássicas, como na Europa. Para entender o que se passou, no Brasil, quem melhor explica é Fernando Henrique Cardoso. Assim, no Brasil, houve uma dependência do desenvolvimento industrial do capital estrangeiro, não criando, assim, uma camada empresarial autônoma, capaz de criar uma relação política, de acordo com esses interesses. Portanto, instaura-se no Brasil, um Estado como realidade política, enquanto a democracia fica apenas como um mito, de forma que o Estado cada vez se torna mais superior e soberano a sociedade esmagando qualquer possibilidade de reação dos grupos não hegemônicos.

Essa atitude acabou por ser uma debilidade política dos grupos dominantes urbanos, que tentaram substituir as oligarquias na hegemonia política de um país tradicionalmente agrário, numa etapa que possibilitava um desenvolvimento capitalista nacional. Foi, neste período, a expressão maior da emergência das classes populares, gerando a incorporação dessas ao jogo político. Portanto, o populismo é mais complicado que mera manipulação, cuja complexidade política não ressalta a complexidade das condições históricas em que se formou, sendo um modo concreto de manipulação das classes populares, ao mesmo tempo uma manifestação da insatisfação das mesmas. Este estilo de governo e comportamento político essencialmente ambíguo, onde os dominantes exerciam seus domínios, em contra partida os seus domínios encontrava-se potencialmente ameaçado.

Getulio Vargas desde que assumiu o Estado em 1930, sempre esteve reformulando as relações entre a classe trabalhadora e o poder estatal. Assim, o número de greves diminui, também, o número de grevistas envolvidos. Como observa Weffort, Getulio Vargas e os políticos populistas criam uma estrutura sindical no Brasil, a qual é a intermediária na relação entre poder político e classes. Em contra partida, a ausência de “partidos políticos”, como na situação atual da política brasileira, que transforma a relação política em relação entre indivíduos. Assim, é necessário analisar a participação popular, através de algumas manifestações políticas, nessa encontra-se principalmente a liderança de massas do tipo populista, a qual foi a principal forma política no período democrático, e o nacionalismo, ideologia que inspirou diversas linhas de organizações políticas e influenciou sindicatos e associações estudantis.

A presença popular é fato evidenciado na etapa democrática pós-1945. Pela primeira vez, na história brasileira as massas urbanas aparecem livres politicamente, contudo é uma liberdade limitada, pois a composição do poder continua a mesma do período anterior. Todavia, terminada a ditadura de Vargas, acaba seu monopólio sobre a opinião popular, embora até sua morte em 1954, será o grande chefe do populismo. O populismo começou a se deparar com suas fragilidades, se mostrando incapaz de manter um equilíbrio entre todas as forças e sobre o processo de ascensão das classes populares. Portanto, Goulart levará o populismo a falência ao tomar o caminho das reformas estruturais.

Embora, a resolução da crise institucional ter ocorrido no governo de João Goulart, seu ápice, assim como indícios de como ela se solucionaria, começa desde a renúncia de Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961. Na verdade, expressou toda uma crise que veio se formando desde 1945. Ocorreu devido às forças das transformações sociais e econômicas, associadas ao desenvolvimento do capitalismo industrial, que assumem um ritmo mais acelerado desde a década de 1930. Tendo dois marcos, já descritos anteriormente, na história do Brasil, a crise do velho capitalismo agrário em 1929 voltado à exportação e o rompimento com a hegemonia política das oligarquias regionais, com a Revolução de 1930, sendo um marco econômico e logo em seguida outro político.

Contudo, com a capitalização das relações sociais dos campos, acaba por gerar a politização dos trabalhadores rurais. Com isso, mostra a distribuição política de alguns lideres, nas regiões rurais e suas respectivas importâncias, de forma que o getulismo e as políticas de massas chegam às regiões rurais e ao Nordeste com algumas décadas de atraso. De forma, que como os proletários rurais se engajam na vida política é similar com a dos sindicatos dos operários industriais, e entre as reivindicações mais audaciosas do proletariado agrícola, está à reforma agrária, assim com um quadro com as formulações sindicais rurais de 1963, prova a emergência tardia dos mesmos. Embora, a introdução deles na política, foi o ápice da crise da política populista, resultando no golpe militar de 1964.

O golpe militar de 1964 iniciou com a partida das tropas do exército de Juiz de Fora até a declaração da ausência do Presidente, o qual mal havia cruzado as fronteiras do Brasil, e a nomeação do presidente da Câmara como Presidente da República, o qual é reconhecido imediatamente pelos Estados Unidos da América, com esse reconhecimento imediato percebe quem esteve por de trás do golpe, ou seja, os estadunidenses estavam apoiando o golpe, só não podiam imaginar que duraria tanto tempo. Tudo isso se deu do dia 31 de março de 1964 ao dia primeiro de abril de 1964.

Para entender melhor o golpe é preciso retomar todo o processo dele. Iniciando em 1961, com a renúncia de Jânio Quadros, o qual havia cansado as elites devido aos seus caprichos, não por menos João Goulart, o vice estava em viagem na China. Assim, Leonel Brizola, entre em cena, tentando defender o posto do vice, com argumento da defesa da legalidade, nesta circunstância a democracia vence a primeira batalha e não a guerra. Esse é o erro de Goulart, que ao assumir a presidência da República, esquece que os militares, juntamente com as elites não desistiriam fácil, assim, Goulart dentro de uma República elitista brasileira, começou por medo do socialismo a atender algumas exigências das classes populares. Esquecendo que não existem só revoltas populares, mas também das elites conservadoras.

Assim, não pune nenhum dos participantes da tentativa do primeiro golpe, esquecendo que muitos movimentos sociais populares se dispuseram a lutar contra o golpe, faltava apenas que a figura de Goulart conseguisse ampliar esta mobilização social, iniciada no Rio Grande do Sul e por último e talvez mais importante, a defesa da legalidade, argumento utilizado por Leonel Brizola era em favor da democracia e não dos movimentos agressivos e ofensivos, conhecidos como os gorilas, que lutavam contra os golpistas. Portanto, não havia o que os detivessem.

No período da renúncia de Jânio ao golpe militar de 1964, foi o período republicano com maior mobilização social. Os movimentos sociais iam a luta e as ruas exigir seus direitos. De forma, que não havia uma alma viva no Brasil, que não soubesse que o país necessitava de reformas, até as elites conservadoras, afirmavam isso. Contudo, os conservadores reclamavam das greves e badernas e da falta de atitude do presidente, que permanecia com atitudes populistas, não calando a baderna dos movimentos sociais. Portanto, havia um medo crescente que se instaurassem um comunismo como o cubano no Brasil, assim, todos desconfiavam de todos a respeito do golpe ditatorial, podendo ser comunista ou capitalista.

Jango teve algumas vitórias no período em que esteve na presidência com ajuda dos movimentos sociais. Todavia, todas suas propostas de reformas enviadas ao legislativo, eram rejeitadas, pela extrema esquerda que as viam como muito conservadora e pela extrema direita que as viam como muito radicais e cada vez mais a sociedade brasileira se polariza. Desta forma, Jango, em outubro de 1963, encontra-se desorientado, de tal forma que tenta decretar estado sítio ao Brasil, porém nem a extrema direita nem a, esquerda aprovam esta conduta. Apenas em março de 1964, Jango decidiu por realizar comícios e reverter à situação de descontentamento social, com o discurso de que neste novo ano o Brasil iria prosperar, se comparando aos grandes heróis, construídos nacionalmente, Getulio Vargas, Princesa Isabel, entre outros. Fez todo um planejamento de Comícios, tendo seu último marcado no dia primeiro de maio em São Paulo. É importante enfatizar que seu primeiro comício em 13 de março, fez bastante sucesso.

A primeira reação conservadora é em São Paulo, com as marchas em nome de Deus e da Família. Logo no Rio de Janeiro, o ministro da marinha entra em atrito com os marinheiros. Assim, agosto de 1961, a defesa da legalidade que defendeu o governo dos golpistas conservadores, em março de 1964, se aparentava diferente. Isto é, viam o presidente Jango agindo na ilegalidade, enquanto as forças conservadoras tentavam, apenas, aparentemente, manter a ordem legislativa. Jango juntamente com as forças reformistas comete um erro brutal, o que facilitará o golpe, jogo os dados da partida, e pensa que a ganhou a batalha. A verdade, é que, ele mexeu com as forças conservadoras e não esperava que essas reagissem. A reação foi imediata, mesmo tentando mediar o caso entre o ministro e os marinheiros, não havia mais volta, as cartas foram postas, o motivo para justificar o golpe estava determinado, a defesa da legalidade. Assim, o país enfrentar os 20 anos de ditadura militar.

Assim, o sistema populista inverter os meios e os fins, tática e estratégica, ideologia e realidade. Contudo, nunca defendendo a ruptura do sistema. Apesar do golpe aparentar ser uma medida militar, na verdade, é uma base de manobra da classe média, e mais uma vez, a solução política da crise brasileira resulta da dependência estrutural. Podendo entender-se o Golpe Militar como uma ruptura com os políticos populistas ou como a impossibilidade de novas formas de política populista. Gomes defende a tese de que o golpe militar de 1964, não tinha como alvo o populismo, mas medo de que esse não conseguisse se adaptar e assim manter-se no poder, ou seja, medo de que a elite perdesse o poder. Segundo Weffort, existiam afinidades entre o populismo dos demagogos e o reformismo nacionalista de 1964. Assim, nos últimos anos do governo de João Goulart, pode-se afirma que houve uma ideologia de substituição, foi um período de crise na hegemonia das classes dominantes, que resume o que se passou em todo o período populista. Um período de crise hegemônica, em que o governo agia, para evitar uma revolução popular.



Nenhum comentário:

Postar um comentário