sexta-feira, 26 de outubro de 2012

FATOS ETERNOS - POPULISMO

FATOS ETERNOS

No mês de agosto podemos destacar duas importantes datas para a história brasileira, que por sua vez são pouco lembradas. Estas estão relacionadas ao período populista no Brasil, o qual se iniciou com a Revolução de outubro de 1930 e teve seu fim com o golpe militar em abril de 1964. A primeira, dia 24 é marcada pela morte de Getulio Vargas em 1954 e a segunda, dia 25 marca a renúncia de Jânio Quadros em 1961. Assim, o passado político brasileiro deve abrir espaço para reflexão e discussão, principalmente devido ao descrédito causado pelo atual quadro político nacional. O principal objetivo deste artigo não é desenvolver ou analisar profundamente o que foi o Populismo, mas sim oferecer um momento reflexivo sobre um tema tão polêmico e atual da política brasileira.

Assim, através do sociólogo Octávio Ianni, do cientista político Francisco Weffort e do historiador Bóris Fausto, iremos para alguns leitores apresentar o tema e para outros o esclarecimento de algumas idéias. Mais uma vez, é necessário lembrar, que a discussão não se encerra aqui, para tanto o aprofundamento do tema nos exigiria tempo e espaço. O rigor teórico tornaria a leitura enfadonha e cansativa para aqueles não habituados aos textos acadêmicos. Portanto, esse artigo será dividido em duas partes, uma que se inicia com a Revolução de 1930 até a Constituição de 1934 e a segunda será de 1934 a 1964, finalizando com o golpe militar e o fim do populismo, iniciado com a Revolução de 1930.

Para iniciar a discussão é preciso destacar alguns episódios do início do século XX, com base no livro Colapso do Populismo de Octavio Ianni que influenciaram direita e indiretamente as transformações político-econômicas no Brasil: a crise da cafeicultura, politização das forças armadas, manifestações dos operários e dos setores médios, aumento do antagonismo das classes dominantes, I Guerra Mundial, a crise de 1929 - que levou a queda da bolsa de Nova York -, II Guerra Mundial (1939-45), o fim da hegemonia européia - França, Inglaterra e Alemanha -, os Estados Unidos da América como detentor da nova política hegemônica, o surgimento de nações socialistas - a União Soviética (URSS), a China e Cuba, a independência da Índia e de países africanos, assim como o aparecimento do Egito e da Argélia como países independentes.

Ianni ainda afirma que os fatos de 1930 foram um rompimento político-econômico, pois estruturalmente não houve mudança, mesmo com os novos setores – proletariado e médio – participando ativamente da vida política do país. Enfim, os acontecimentos políticos, nas primeiras décadas do século XX, só evidenciam o conflito urbano-industrial no Brasil. Contudo, Boris Fausto em sua obra Revolução de 1930, discorda dessa idéia e com embasamento historiográfico a desconstrói.

Para Fausto o período populista foi uma revolução política no Brasil, que ocorreu na década de 1930 e determinou o fim da política do café com leite, que consistia no revezamento de presidentes da república paulistas e mineiros, e o fim da República Velha. Também, é nesse período que o conceito de cidadania no Brasil sofre mudanças, devido às vitórias dos movimentos sociais do período da República Velha, como anarco-sindicalismo, até então ilegais. Todavia, Fausto ressalta concordando com Ianni, que não foi a Revolução de 1930, que colocou em questão o poder das oligarquias, mas sim a economia e as relações de produção; a estrutura social permaneceu a mesma, intacta.

Para explicar sua tese, Fausto usa da mesma ferramenta de Ianni, retoma os acontecimentos da década de 1920, quando o sistema apresentou sinais de inconformismo, inquietantes da “classe média urbana”, principalmente devido ao movimento tenentista. Mostra que a crise na hegemonia do café abriu espaço para que outras elites da época crescessem e conseguissem o apoio da “classe média urbana”. Devemos observar também que a escolha do presidente Washington Luís, do PRP (Partido Republicano Paulista) em não apoiar o candidato à presidência da república mineiro, mas sim em apoiar o candidato paulista Júlio Prestes, fez com que a elite mineira e o PRM (Partido Republicano Mineiro) se sentissem traídos pelos paulistas, se tornando opositores e unindo-se a outras elites excluídas na República Velha, principalmente, a paraibana e a gaúcha.

No entanto, a Revolução de 1930, segundo Boris Fausto, teve sucesso devido à multiplicidade política em São Paulo. A diversidade política começa a ser notada em 1926 quando surge o Partido Democrático Paulista (PD), opondo-se ao republicano paulista de Washington Luis (PR). O historiador ressalta que no Rio Grande do Sul, Estado natal do candidato em 1930 a presidência Getúlio Vargas, onde também havia diversas vertentes políticas, onde duas se destacavam - a federalista e os republicanos.

Dentro desse contexto, a aliança dos três Estados Paraíba, Minas e Rio Grande do Sul, juntamente com o partido paulista PD, criam a Aliança Liberal (AL). Assim, observa-se que a burguesia industrial, sobretudo dos dois principais pólos industriais, São Paulo e Rio de Janeiro, não apoiaram a Revolução de 1930. Em contra partida, nota-se que um pequeno número de burgueses apoiava a Aliança Liberal e a revolução. Apesar disso, ela não foi o marco de ascensão da “classe média urbana” ao poder, isso aconteceria muito posteriormente.

Deste modo, nas eleições de 1930, a AL e o movimento tenentista, formado pelos jovens de baixo escalão do exército, apoiaram o candidato gaúcho Getulio Vargas, a presidência da República tendo como vice-presidente o paraibano João Pessoa. Com isso, podemos estabelecer a relação do movimento tenentista com a Revolução de 1930 e observar a participação de muitos tenentes no governo Vargas (1930-34), quando estes ocuparam cargos públicos. Isso nos leva a diferenciar o movimento tenentista pré-Revolução de 1930 e pós-Revolução de 1930. Em linhas gerais o movimento tenentista na década de 1920, é um movimento ideologicamente político com características militares e tendências revolucionárias autoritárias. Inicia-se no Rio Grande do Sul, ganha força e importância e se irradia pelo Brasil. Porém, em 1930, ao invés de manter sua ideologia termina por aderir as das oligarquias vigentes, que responsáveis pelo golpe de outubro a favor de Getúlio Vargas, segundo Fausto.

Contudo, Vargas não teve muita sorte, perdendo a eleição para Prestes. Não contente com o resultado das urnas, as elites mineira e gaucha alegam fraude. Com o assassinato do candidato a vice-presidência João Pessoa, Vargas tenta a conciliação com o governo de Washington Luís e Júlio Prestes, porém, não obtendo sucesso. Próximo de Prestes assumir a presidência, Getúlio Vargas, com apoio das elites gaúcha, mineira e paraibana, decidi-se pela Revolução, tendo seu auge com o combate de Quatiguá, em 13 de outubro de 1930. Assim, em 24 de outubro de 1930, Washington Luís é deposto e Getúlio Vargas assume a presidência, elaborando uma constituição provisória.

São Paulo descontente com perca do poder político se reorganiza, assim PD e PRP se unem, lutando lado a lado fazendo uma contra Revolução em 1932, devido à falta da constituição nacional, contrário aos decretos e exigindo a elaboração de uma nova constituição. A morte de quatro estudantes no dia 9 julho de 1932 marca o início do conflito. Assim, a elite paulista espera o momento propício para entrar em combate contra governo nacional, para isso pede o apoio da elite mineira e gaúcha. Porém, Getúlio Vargas utiliza-se do seu poder de negociação, fazendo com que os mineiros e os gaúchos deixem de apoiar a revolta dos paulistas e apóiem o governo nacional. Então, os paulistas vão ao combate com pouca chance de vitória, já que seus aliados o traíram. Assim, no dia 4 de outubro de 1932, após dois dias de rendições, os paulistas são derrotados militarmente. Não satisfeitos, em 1934, inauguram a primeira Universidade Estadual do Brasil, a USP (Universidade de São Paulo), abrindo mão de ser uma elite militar, para ser uma elite intelectual.

Portanto, a Revolução de 1930 com a participação do movimento tenentista, marcam o fim da burguesia cafeeira, a qual até então era a única classe nacional hegemônica e que leva o Brasil a se inserir no contexto do sistema capitalista. Contudo, não havia nenhuma força de classe para dominar o poder, o proletariado era caracterizado pelo limite de intervenção, as classes médias devido a sua heterogeneidade não conseguiam se impor. Com isso, a Revolução de 1930, não foi revolucionária. Assim, como lembra o autor Tristão de Ataíde, a Revolução de 1930 e todo o seu processo de conservação permitiram que a sociedade brasileira evolui-se politicamente, mais do que em todo o período da República Velha e da Monarquia. “O outubrismo foi, de certo modo, uma infância do jogo revolucionário. Sua falência, portanto, é uma maioridade.” (Fausto, 1997, pp.151).

É dentro desse contexto que surgem os políticos populistas, os quais possuem influências fascistas, comunistas, liberais, utilizando diversos instrumentos destes diferentes sistemas para se manterem no poder. Encontram-se exemplos disso no Estado Novo e na Ditadura de Getúlio Vargas, que apelava para medidas políticas nacionalistas e também para medidas de caráter participativo como a legalização dos sindicatos. De forma que definir um governo populista como fascista, totalitário, democrático é muito mais complexo do que possa se imaginar. Pois nele encontram-se diversas contradições, as quais se analisadas com delicadeza, percebe-se que são simplesmente com o objetivo de manter a hegemonia da elite dominante e evitar revoluções, mudanças estruturais. Assim, através de mediações entre a sociedade civil e o Estado, movimentos sociais foram desarticulados e os sindicatos submetidos ao governo. Os governantes populistas também são conhecidos por serem “o pai dos pobres e a mãe dos ricos”, pois tentavam através de políticas populares mascararem suas verdadeiras ideologias. Em suma, eram líderes carismáticos e que conseguiam transformar as vitórias dos movimentos sociais em benfeitorias do Estado. Assim, Getúlio Vargas em sua carta-testamento, acerta ao afirmar: “Saio da vida para entrar para história.”

[1] Citação: LIMA, Alceu de Amoroso. Indicações políticas. Da Revolução à Constituição. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1936, p.242

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